Sintra volta a assinalar o Dia Municipal para a Igualdade (24 de outubro), este ano com a realização do seminário “As profissões têm sexo?” que vai decorrer esta terça-feira, a partir das 14h00, no auditório da Casa da Juventude da Tapada das Mercês. Uma iniciativa que pretende sensibilizar para a necessidade de desconstruir estereótipos de género ligados às profissões. Para o efeito, para além de uma mesa redonda de reflexão sobre a tónica da igualdade, serão exibidos depoimentos de trabalhadoras municipais que desempenham funções dominadas pelo género masculino. É o caso, por exemplo, das varejadoras Tânia e Vanessa nos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Sintra (SMAS de Sintra).

Os SMAS de Sintra contam com cerca de mil trabalhadores, para dar resposta às suas três áreas de atuação: distribuição de água, drenagem e tratamento de águas residuais e recolha e transporte de resíduos urbanos. Embora predomine o género masculino, as mulheres assumem cada vez mais importância na organização e, no total de 26 departamentos e divisões, 15 unidades orgânicas são lideradas por mulheres.

O género masculino acaba por dominar nos serviços mais operacionais, mas há exceções à regra. Tânia Alves e Vanessa Viana são varejadoras. Uma profissão esmagadoramente masculina, mas que conta, há mais de um ano, com esta presença feminina. São, aliás, as primeiras duas varejadoras dos SMAS de Sintra.

Integradas na Divisão de Ambiente e Águas Residuais, uma das três unidades do Departamento de Exploração e Conservação, as duas trabalhadoras cumprem, sem qualquer condicionalismo, as tarefas, atribuições e responsabilidades do seu posto de trabalho: a execução de tarefas de desobstrução, limpeza de coletores, caixas de visita e ramais domésticos e pluviais; a reparação e instalação de coletores; a substituição de tampas de caixas de visita da rede de drenagem; o despejo das fossas sépticas; o acompanhamento a processos de desinfeção de coletores e a realização de inspeções vídeo. Asseguram também a deteção de ligações indevidas, com recurso a equipamento gerador de fumos.

Para concretizarem a respetiva missão, a pá e a picareta são, muitas vezes, os equipamentos que saltam à mão. Vanessa e Tânia não viram a cara à luta e, com o apoio dos colegas, já levam mais de um ano de casa, cumprido no passado dia 1 de junho. Por estes dias, acompanhámos umas horas do trabalho destas duas varejadoras, que integravam a equipa de piquete, chamadas a dar resposta, entre outras, a ocorrências de desobstruções de ramais domiciliários e de coletores.

A desempenharem o trabalho em regime de dois turnos rotativos, das 8h00 às 15h00 ou das 15h00 às 22h00, inclusive aos fins de semana, Vanessa e Tânia reconhecem que a adaptação tem sido facilitada pelos colegas e nem o trabalho mais pesado, que deixa marcas nas mãos e no corpo, as faz desistir.

Tânia Alves, 26 anos, confessa que aprendeu a gostar das suas funções, mas reconhece que, “no início, nem sabia o que era ao certo, mas os colegas, grande parte deles, ajudam bastante e facilitam”. Apesar da colaboração dos colegas, a predisposição das duas varejadoras, mesmo perante o trabalho pesado, é meio caminho andado. “Nós conseguimos, nós fazemos” foi sempre a garantia das duas varejadoras, frisa Tânia Alves, perante os maiores obstáculos que enfrentavam. “No início, foi um bocadinho complicado, é um trabalho de muito esforço, não estávamos habituadas, mas agora faz-se bem”, realça Tânia, numa leitura também partilhada por Vanessa. “No princípio, foi mais complicado”, salienta esta trabalhadora dos SMAS de Sintra que, aos 41 anos, não hesita em classificar esta experiência como “o melhor emprego” das suas mais de duas décadas de percurso profissional. Vanessa enuncia ainda que, nos primeiros tempos, foi particularmente penosa a missão de limpeza das fossas sépticas, que obriga a carregar mangueiras “pesadas e muito compridas”, mas, agora, as dificuldades foram atiradas para trás das costas.

Curiosamente, acabam por ser os munícipes que mais estranham a presença feminina nas funções desempenhadas por Tânia e Vanessa. “No outro dia, estávamos eu e a Tânia a fazer uma inspeção vídeo a coletores, acompanhadas por um agente da polícia a parar o trânsito, e chega um senhor e vira-se para o polícia e diz: ‘então, o senhor, em vez de estar a ajudar as meninas, está aqui a fazer o quê? E eu respondi: ‘cada um tem a sua função’”, recorda Vanessa, ao mesmo tempo que enuncia “a atenção” dispensada pelos colegas aquando de trabalhos mais pesados.

Se, em muitas ocasiões, a necessidade de desobstrução da rede de saneamento, composta por cerca de mil quilómetros de coletores e emissários no caso do concelho de Sintra, resulta de situações naturais, como o abatimento de terras ou até a invasão de coletores por raízes de árvores, outras há que derivam do incorreto encaminhamento de resíduos.

Tânia Alves recorda uma ocorrência em que, quando levantou a caixa de visita, se deparou com um cenário inimaginável e até ficou bloqueada. “Não havia água, só havia toalhetes, até cá acima, era uma massa rija”, recorda esta trabalhadora dos SMAS de Sintra, que lamenta a atitude de alguns munícipes: “Metem pela sanita abaixo coisas que não lembram na cabeça de ninguém. Já apanhámos roupa, uma fralda de bebé…”. Também Vanessa lamenta que, em muitos casos, a rede de saneamento seja utilizada como local de deposição dos mais variados resíduos.

Atualizado a 18/10/2021